Quando a corrente passa pelo BMS


  • A questão da protecção do sistema eléctrico do VE é um excelente ponto de discussão e muitas vezes negligenciado.

    O curto circuito:

    O curto circuito num VE é extremamente difícil de proteger para todos os casos possíveis devido ás dezenas, centenas (ou milhares) de fontes de tensão existentes.

    Estamos a falar de BMSs para scooters eléctricas vamo-nos concentrar nas dezenas de células.

    Um pack de 72V constituído por 24 células em série contém 300 curto-circuitos potenciais que um sistema de protecção contra curto circuitos convencional para lá do Pack + ou anterior ao Pack – não tem capacidade de cortar. Não estão aqui considerados os curto-circuitos potenciais dentro das próprias células. Apenas a possibilidade de se ligarem extemporaneamente dois pontos de diferentes potenciais nas ligações dos terminais de cada célula do pack. A probabilidade de cada uma destas possibilidades varia muito com a disposição do pack, tipo de isolamentos, distâncias, etc.

    Uma comparação para várias voltagens:

    48V 16 Cells -> 136 curto-circuitos potenciais nas ligações do pack
    60V 20 Cells -> 210 curto-circuitos potenciais nas ligações do pack
    72V 24 Cells -> 300 curto-circuitos potenciais nas ligações do pack
    96V 32 Cells -> 528 curto-circuitos potenciais nas ligações do pack
    126V 42 Cells -> 903 curto-circuitos potenciais nas ligações do pack

    Há aqui uma correlação polinomial quadrática entre o número de curto-circuitos potenciais nas ligações do pack e o número total de células.

    Não é viável semear fusíveis entre todas as células porque o circuito em série está dimensionado para correntes elevadas e um curto circuito entre os terminais de uma célula de 3V tem características distintas de um curto circuito de por exemplo 72V. Quando o pack está dividido por vários locais dentro do VE a colocação de um fusível nas interconexões é uma boa ideia.

    De notar ainda que existem veículos que usam a massa do chassis como elemento condutor criando ainda problemas adicionais de isolamento.

    A instalação do pack deve ser feita com todo o cuidado na escolha de materiais, routing e protecção do isolamento de todos os cabos e conectores. Devem ser antecipados e verificados todos os cenários desfavoráveis. Esta é uma das razões pelas quais um VE dependendo da proveniência deve ser completamente revisto antes de ser colocado ao serviço do cliente.

    Para os curto circuitos que não ocorrem directamente entre células os sistemas de protecção devem estar bem dimensionados e existir redundância.

    Um vulgar fusível ATO de 30A usado nos automóveis funde com 60A entre um tempo de 0,1s a 5s. Esta enorme variação pode ser suficiente para proteger cabos eléctricos bem dimensionados mas pouco mais. Estão vulgarmente limitados a 32v DC.

    Um vulgar fusível ATO de 7,5A funde com 200A na melhor das hipóteses ao fim 1,5ms. Este tempo é uma eternidade para equipamentos electrónicos delicados.

    Os vulgares fusíveis ANE, CNL, CNN de 80A, 160A, 200A, 250A, etc. que abundam nos VE estão na sua maioria limitados a 32V DC. A extinção do arco eléctrico resultante da ruptura do fusível a tensões superiores dá-se de forma deficiente, tardia, ruidosa e com projecção aleatória de matéria incandescente. Existem destes equipamentos para tensões superiores mas são mais caros e têm ser especificamente seleccionados de outras fontes. A maior parte dos fornecedores on-line de material EV barato opta por nem sequer divulgar a sua tensão nominal.

    Um vulgar fusível ANE de 160A pode permitir a passagem de 400A durante no máximo 300s (5 minutos). A combinação destes eventos com o tempo frio pode tornar inútil este tipo de protecção.

    Chegamos ao disjuntor. É muito útil até para funcionar também como seccionador para intervenções no circuito eléctrico.

    A maior parte dos VE que vêm do oriente equipados com disjuntor geral este não têm a especificação correcta para o fim a que se destina.

    Aquecem em demasia e passado pouco tempo começam a disparar em circunstâncias normais.

    Um disjuntor para o mercado residencial ou industrial AC não tem geralmente especificações para trabalhar em DC ás mesmas tensões. O corte de uma corrente DC é muito mais problemática do que em AC 50Hz em que a corrente se anula 100 vezes por segundo favorecendo a extinção do arco eléctrico.

    Costumo utilizar como seccionador e protecção redundante disjuntores Siemens Curva C, largura 1.5, tarados para o corte de curto-circuitos em DC de 10KA segundo a norma EN 60898-2 e 15KA segundo a norma IEC 60947-2.

    Porque a corrente total passa através do BMS, na primeira linha utilizo a protecção de corte rápido via MOSFETs do iBMS em que posso programar o valor da corrente em degraus (36A-360A ou 63A-630A dependendo dos valores das resistências de current sense) bem como um delay na detecção entre 50µs e 500µs.

    Esta reacção é tão rápida que é possível provocar um curto-circuito de 500A com um fusível de ATO de 7,5A, a corrente é cortada sem que o fusível tenha a oportunidade de fundir.

    O leitor poderá dizer: Muito bem. Impressionante, mas em que é que isso contribui para a minha felicidade?

    Quando se parametriza a configuração de um VE é suposto os valores máximos de corrente de carga e descarga ocorrerem em certas circunstancias. Quando algo se altera durante o padrão normal de utilização é sinal de que algo está a funcionar fora de especificações e deve ser investigado o quanto antes. Falhas catastróficas em controladores de motor e carregadores têm geralmente custos elevados associados.

    O elo mais fraco nos controladores de motor bem projectados são os condensadores electrolíticos do DC bus. Quanto maior for a temperatura de funcionamento menor será o seu tempo de vida.

    Quando a corrente total passa pelo BMS este funciona como um corte geral de corrente quando a ignição está desligada – segurança acrescida, aqui nada se passa.

    Quando se liga a ignição em vez da corrente carregar de forma violenta os condensadores do DC bus do controlador do motor retirando-lhe dias de vida por cada uma destas operações o iBMS carrega de forma controlada os condensadores e monitoriza a subida da tensão – esta operação denomina-se por pré-carga. Se a tensão deixar de subir significa que existe uma fuga em um dos condensadores e a falha do mesmo será eminente. O processo de pré-carga é interrompido o circuito principal dos MOSFETs nunca é fechado. O controlador pode ser reparado de forma barata trocando apenas os condensadores. Isto mais tarde ou mais cedo acaba por acontecer com todos os controladores é uma questão de tempo e temperatura. A falha pode obviamente acontecer em marcha e aqui a capacitância do DC bus encarrega-se de fazer a festa mas uma grande parte destas falhas dão-se no startup.

    Durante as falhas catastróficas neste tipo de eventos por vezes até desaparecem pistas da placa de circuito impresso e muitos outros componentes dispendiosos são levados na avalanche. A reparação torna-se muitas vezes inviável. Um bom controlador é bem mais caro do que o BMS.

    Mas podemos ter um contactor, uma resistência, um circuito e uma posição na chave p/ pré-carga. Claro que podemos. Mas quando finalmente ligamos o contactor ninguém sabe se a pré-carga foi realizada com sucesso ou não e aí...

    Mas podemos ter um controlador Sevcon que controla directamente um contactor externo e também faz a pré-carga controlada. Claro que podemos. Mas nem todas as instalações têm um Sevcon e no caso do Sevcon o iBMS faz a pré-carga e não precisamos de um contactor no meio das pernas a dar tiros a toda a hora. Um contactor Albright pode custar mais cerca de 100€ até nos chegar a casa.

    Quando toda a corrente passa pelo BMS a operação do disjuntor não tem qualquer risco. No caso contrário temos de novo o problema da pré-carga quando se fecha o circuito. Mas podemos ter uma resistência a fazer o by-pass do disjuntor. Claro que podemos. Mas o propósito do seccionamento fica desvirtuado. Permanecem constantes as correntes de fuga pelo circuito de descarga do DC bus e os erros de operação manual são frequentes.

    Quando toda a corrente passa pelo BMS podemos usar cargas rápidas em DC com toda a segurança e carregar a maior parte do pack em uma hora estando a instalação eléctrica preparada para tal.

    Quando toda a corrente passa pelo BMS podemos usar um mix entre carregador on-board e carregador externo com segurança estando a instalação eléctrica preparada para tal.

    Quando toda a corrente passa pelo BMS podemos partir com a moto carregada do restaurante e descer até á barragem sendo a travagem regenerativa cortada pela análise individual da tensão de cada célula e não pela avaliação da tensão total no controlador do motor.

    Quando toda a corrente passa pelo BMS podemos trabalhar com todo o tipo de carregadores. Já me cruzei com vários carregadores que amuam quando são cortados apenas num sentido – caso de todos os BMSs que cortam o carregador em separado com o recurso a MOSFETs. Também alguns amuam quando são cortado por um período breve de tempo, mais uma vez aqui o iBMS tem ajustes para estes casos exóticos.

    De corte de carregador por relés nem vale a pena falar dada a baixa capacidade de corte de corrente, falta de fiabilidade, susceptibilidade á vibração do VE na estrada, vida limitada e diminuída pelas operações de balanceamentoo, preço e atravancamento elevados se for seleccionado um equipamento á altura da circunstância.

    A desvantagem de tudo isto é um aumento de resistência interna no path de corrente. O valor global continua muito baixo face aos benefícios.

    Um contactor Albright de 250A tem uma queda de tensão de 40mV nos contactos por cada 100A de corrente. Os contactores baratos nem publicam os respectivos valores, por boa razão não será certamente.

    O iBMS na versão de 5KW (3 x 1mOhm sense + (5 + 5 MOSFET) x 2mOhm) tem uma queda de tensão de 120mV por cada 100A de corrente.

    A 100A (7KW) ainda se dissipa mais potência na bobine do contactor do que por efeito ohmico no current sense e MOSFETs do iBMS. Até do ponto de vista energético esta solução é ligeiramente mais eficiente embora alguns controladores como o Sevcon possam ainda baixar a corrente na bobine do contactor depois do armar (se a bobine não possuir economizador).
    MVS
     
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  • Afinal o que é melhor!!!???
    Orlando
     
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  • A respeito dos curto circuitos a Tesla usa na sua bateria fusíveis individuais por células.

    Mas deve ser pouco prático .
    MRider
     
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  • Até 6KW nominais e 9KW de pico faço passar a corrente pelos MOSFETs do iBMS daí para cima não (embora tenha picos de 13KW em instalações de carros de golf com este processo, depende dos MOSFETs usados).

    Alternativamente uso sensor de corrente de efeito Hall no cabo de potência. O circuito de potência pode ser cortado ou não por contactor (mais segurança = custo superior), a protecção deve ser efectuada com disjuntor e ou fusíveis.

    O iBMS em caso de LVC (corte por baixa voltagem) de uma célula corta em separado com MOSFETs o enable do controlador do motor e o DC/DC converter a diferentes valores para não deixar o condutor sem luzes durante a marcha.

    O corte de carregador durante a carga (HVC) é feito através de um relé solid state de 25A 240V AC na sua alimentação. Pode ser usado mais do que um relé para vários carregadores potentes. O corte e ligação do circuito AC é feito c/ "zero crossover switching" ou seja nos pontos zero da sinusoide, poupando o circuito AC do carregador.
    MVS
     
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  • Magnífico post........ ;) mesmo de Mestre.


    Meus parabéns!
    ECS
     
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